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Quatro dias após a morte de David Kauan Silva da Costa, de 12 anos, que foi atropelado por um trator em um lixão em Teresina, a perda ainda dói muito para a família. A mãe tem dificuldades até para ficar de pé. Na casa alugada, de poucos cômodos e sem estrutura, familiares guardam com saudades a pipa pendurada na parede, a beliche que ele dormia com as duas irmãs e uma mochila com livros.
No material escolar havia também uma prova que tinha um significado especial para o garoto. Segundo a avó, Maria Albetiza, após muito tempo, ele havia conseguido tirar uma nota boa na escola e saiu escondido para catar recicláveis e conseguir dinheiro para comprar uma pizza e açaí para comemorar com a mãe. Infelizmente, ela só soube do motivo após a morte trágica do filho.
"Naquele dia, ele havia conseguido melhorar as notas e queria comemorar. Guardou a prova com nota boa e saiu escondido pra catar recicláveis e comprar uma pizza e açaí pra comemorar com a mãe. Ele contou pra irmã que ia dar esse presente para mãe. Me surpreendo a cada minuto, com as coisas que ele fez e deixou", disse a avó quem trabalha como diarista.
Com a morte dele, além da infância, vários outros sonhos foram interrompidos como o de ser policial e o de comprar um sofá e pintar as paredes da casa onde morava a família. O pai de David foi assassinado há alguns anos. Ele era cuidado pela mãe e o padrasto que são catadores de recicláveis e também trabalham no aterro sanitário. Por questões de saúde, ela estava afastada e aguarda há mais de um mês por uma consulta.
Com saudades, a avó abriu a casa ao Cidadeverde.com e mostrou os xodós de David. Ele criava um coelho, um galo e também um cachorro que se chama Beethoven.
Infância interrompida
A avó diz que o garoto tinha boa frequência escolar, mas não era um bom aluno, situação que preocupava a mãe. Por outro lado, o menino demonstrava interesse pelo trabalho, tinha o sonho de comprar uma bicicleta motorizada e queria ser policial. A família disse que via com preocupação a vontade dele em trabalhar e que a mãe chegou a proibi-lo de sair de casa para conseguir dinheiro. Por vezes, ele chegou a capinar e trabalhar em caieiras de carvão.
David cursava o 7º ano do Ensino Fundamental. A avó disse que ele frequentava a escola com assiduidade, fazia reforço escolar, mas o aprendizado era lento.
"Nos últimos dias, o David estava chateado porque a mãe havia proibido, de forma mais firme, para que ele não procurasse serviço nenhum, pois as notas dele estavam muito baixas. Eu me via muito na situação dele, porque sou escrava do trabalho, nunca tive infância. Mas nosso maior sonho era ver ele formado, seria o primeiro da família. As notas dele já tinham melhorado um pouco, mas ele não tirava essa ideia de trabalhar, acho que queria provar que poderia ficar bom na escola e no trabalho. Via a mãe doente, sem poder trabalhar e, algumas vezes, saiu de casa escondido para conseguir dinheiro e chegava com coisas pra ele, pra mãe e pras irmãs comerem. Ela só sabia depois quando ele chegava com as coisas e todo sujo. Não era serviço fixo, de rotina, mas ele tinha essa preocupação, via a mãe doente e se achava o responsável pela família, o homenzinho. Ele tinha a ilusão de que podia resolver as coisas já trabalhando e acho que, por isso, o aprendizado dele era lento", disse a avó.
"Não pode ter sido em vão"
A avó disse que não guarda mágoas do maquinista que acidentalmente atropelou o neto. Ela pede que a morte de David não seja em vão.
"Não queria que o lixão fosse fechado, pois muitas família dependem de lá. Nossa vida não é boa, mas seria muito pior se não fosse o lixão. Eu queria que isso não ficasse em vão, que melhorassem as condições de lá, colocassem refletores, usassem carros-pipas para diminuir a poeira. Se tivesse iluminação, talvez o tratorista tivesse visto. Se as autoridades querem fazer algo, que deem condições de trabalho. Ele foi usado por Deus e o legado que poderia deixar é um dia a gente olhar para trás e ver que ali melhorou, que as famílias conseguem criar seu filhos com dignidade. Seria a mãozinha dele ali", desabafa a avó.
Nesta quinta-feira (26), familiares do garoto foram ouvidos na 4ª Delegacia Seccional de Teresina.
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